As Rosas
Todas as rosas são majestosas, elas são como mães e amantes. Não importa a cor. Mas as rosas brancas têm um encanto particular sobre mim.
Durante grande parte de minha infância, convivi com a Arte dentro de casa. Minha avó era uma artista. Ela também era florista. Desenhava, pintava e modelava. O resultado tinha a naturalidade das rosas, dos cravos e dos crisântemos de verdade. Apenas lhes faltavam o aroma e o orvalho.
Eu frequentava aquele cômodo da casa que ela fazia de ateliê. A memória afetiva me lembra a alquimia das tintas, as ferramentas em uso, as modelagens e as montagens.
As rosas exerciam encantamento sobre ela. Por mais de uma vez, a escutei dizendo que sua música preferida era "As Rosas Não Falam", do Cartola. Ela gostava dessa poesia, e eu amo também.
Eu, mais diplomata, e ela, mais segura para as iniciativas. Em resumo, era como existisse admiração mútua entre Vênus e Marte.
Eu, mais diplomata, e ela, mais segura para as iniciativas. Em resumo, era como existisse admiração mútua entre Vênus e Marte.
Muitos anos se passaram. Eu já estava bem longe de casa. Eu já sabia que minha avó não estava bem de saúde. A melancolia a fragilizava, como faz com muitas pessoas, conforme a idade avança, por saudade dos amigos que morrem, ou por causa da menor mobilidade física e sensorial. As memórias da minha avó iam se pulverizando. Para alguém tão dinâmica e vívida como foi na maior parte de sua vida, esse processo foi injusto, mas felizmente não se estendeu.
Um dia, eu soube eventualmente que aquele era o dia dos avôs. Na mente, me veio uma intuição e desejo de lhe enviar rosas. Através de um site de vendas de flores na internet, eu a enderecei um buquê de 24 rosas vermelhas. À noite, conversamos pelo fone e me disse que a primeira parte do dia tinha sido triste, mas que isso mudou ao receber minhas rosas tão bonitas. Nunca mais nos falamos. Não imaginava que esse momento tinha sido a nossa despedida.
Sua partida foi em um Novembro e o Natal daquele ano foi o primeiro sem a presença da minha avó, que amava o Natal. Estávamos reunidos em casa, minha mãe finalizava a mesa do jantar, eu havia me sentado à mesa, e neste instante, senti uma inconfundível fragrância de rosas. Assim como chegou de repente, se intensificou e desapareceu em um segundo. Mas não existiam flores em casa. Ninguém sentiu o quê o meu olfato sentiu. Me silenciei, mas pra sempre, essa recordação é uma interrogação na minha mente.
Hoje, recapitulando minhas memórias, suspeito que as rosas sempre estiveram entrelaçando a nossa estória, de minha avó e eu.
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